
Felipe Martins Barzan
08/10/1984
-05/03/2022
O sonho de Felipe e Marina, duas crianças nascidas no calor de São Paulo, era ver a neve. Os pais, Wilma e Helio, os levaram para Bariloche, Argentina, nos anos 90, onde os dois não só realizaram o sonho de andar na neve, como também esquiaram e viveram uma história memorável: Felipe, de tão animado que estava, enfiou a mão no gelo e congelou os dois dedinhos.
Aos 12 anos, Felipe se mudou com a família de São Paulo para Caxias do Sul, RS, e sempre sentiu saudades da cidade grande. Ele falava muito em se mudar de volta para SP, vontade que só passou mesmo quando ele começou a se envolver com os planos de ter seu próprio restaurante, um sonho muito antigo. Ele sempre gostou de cozinhar e, em seu último ano, estava prestes a assumir uma pizzaria e um sushi, em Garibaldi, RS.
“Não é preciso ter motivos para celebrar”, dizia Felipe quando arrumava a mesa e fazia um jantar especial para a família. Nos encontros, era sempre ele que cozinhava. Uma porque amava culinária, mas outra porque, genioso como era, só gostava mesmo das coisas feitas do jeito dele.
Felipe era 8 ou 80: ou amava ou odiava. Era muito caseiro mas, quando decidia sair, passava três dias seguidos em uma rave. Ele não costumava ouvir os outros. Certa vez, adotou um vira-lata preto, em Torres, RS, e o levou para casa, apesar de todos alertarem que o cachorro ficaria gigante. Feijão, como o denominou, ficou mesmo enorme, e destruiu até o piso do kitnet onde Felipe morava. Mas ele nunca se importou. Aliás, ele não era nada apegado a coisas materiais: andava com a mesma camiseta há quinze anos e não se preocupava se o tênis já estava furado.
Talvez por ter esse gênio forte, Felipe não tinha tantos amigos que compreendiam essa personalidade. Mas tinha Cecília. Ele e a afilhada eram muito próximos. Felipe deixava que ela fizesse tudo que queria, inclusive, tomar banho de torneira no parque. Eram parecidos fisicamente — nos passeios, achavam que eram pai e filha, dividiam gosto musical (Anitta e Alok, por exemplo) e até viajaram de avião a Florianópolis, quando a menina tinha apenas quatro anos. Felipe e Cecília eram unha e carne. Mas nem todo o amor do mundo impediu que Cecília começasse a chorar desesperadamente de saudades de casa após o segundo dia de viagem. Só parou quando o tio comprou uma variedade de bicos na farmácia, que ela precisou voltar a usar para se acalmar. “Nunca mais”, ele dizia, rindo, ao lembrar dessa viagem. Foi Cecilia que, aos nove anos, foi “a babá” de Felipe, quando ele adoeceu.
Professor de Biologia para alunos do sexto ao nono ano, se dava muito bem com os jovens, que sempre o convidavam para ser paraninfo. Além de dar aulas, adorava estar na natureza. Um dos seus locais preferidos era o Ninho das Águias.
Felipe era uma pessoa que se doava muito, especialmente à família. Pensava mais nos outros do que nele mesmo. Tanto que, quando ficou doente, nunca contou como realmente estava se sentindo, para não preocupá-los.
Na sua última semana de vida, disse à família que receberia alta do hospital no sábado, o que sabia que não era verdade, porém, era uma versão mais reconfortante. Antes de ir para a UTI, mandou um áudio para a irmã, para que ela não se preocupasse, que estava tudo bem. Para a mãe, que conseguiu ver no caminho da unidade intensiva, sorriu e abanou.
Felipe despediu-se cedo. Mas suas memórias seguem vivas. Suas cinzas foram espalhadas em dois locais que gostava muito: na tranquilidade da praia de Paraíso, RS, e no agito da Avenida Paulista, SP. O restante ficou com Cecília, que o carrega em um pingente, próximo ao coração, onde ele sempre esteve.
Texto: Valquíria Vita, Legado Histórias de Vida
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Comentários
Marina
Meu Deus, Valquíria, quanta sensibilidade e como você realmente consegue traduzir em palavras a essência das pessoas... chorando litros de gratidão.
25/05/2023Martinho
Cada sentimentos ao seu lado eram de alegria. Sempre olhando para o futuro e sabia o que sentia Foi ao meu lado como
25/05/2023Jaqueline
Q lindo obituário! Ao ler fiquei imaginando q pessoa sensível e desapegada devia ser o Felipe!
25/05/2023Wilma
Muita honra de ser sua mãe…. Meu filho “Amado”
26/05/2023Evandra
Um filme passou na minha cabeça agora! Quanta saudade do meu amigo, confidente e incentivador! Nosso tempo juntos foi pequeno, mas profundamente intenso. Felipe meu querido, você foi grande... Grande de coração e alma.
26/05/2023Alexa
Muita saudade do seu olhar, do seu sorriso e do seu acolhimento sempre que nos encontrávamos. SAUDADE!
26/05/2023Livia
Eu tive a sorte de poder ter chamado o Felipe de "Sor" durante o dia e, nos finais de semana quando ele fazia festa com meus irmãos, de Barzan. Era algo muito diferente (e legal para a pré-adolescebte) ter o contato do professor divertido de biologia - e poder ligar para ele para pedir como conservar o morcego que o gato matou as 21 horas de um dia de semana qualquer. Ele iria prontamente dar uma risada, passar as instruções e agradecer pelo presente para o laboratório. Sua maneira muito alegre, paciente e com muita zoeira de lidar com os humaninhos que fervilhavam hormônios faziam a Biologia não ser aqueles periodos que ninguem queria fazer. Que bom que tenho muitas lembranças carinhosas com ele e, claro, da sua tão marcante gargalhada. Obrigada Val e Legado por darem um cantinho para a gente homenagear o professor Felipe!
06/06/2023